11.3.09

bailarinas do faustão

Saía de noite sozinho, pegava o carro com vidros escuros, todos fechados, colocava Alanis no volume médio e sentia vontade de fumar. Nunca havia posto um cigarro na boca, só bebida barata. Não que não pudesse comprar, mas sentia-se próximo do limite aceitável que estabeleceu pra si quando invadia um pouco o outro mundo. Passando a linha, já seria degradante. Até ali, era cool.

O cool é uma coisa inventada por rico com desejo de ser pobre, sabendo que volta pro seu palácio assim que a fantasia terminar. É paty pagando de hippie. Viver no limite era isso, andar um passo adiante, dormir em seu ninho de ouro.

É claro que preferia a noite ao dia. Porque era tudo mais interessante. À noite as pessoas te olham no olho, de dia isso não acontece. Todos perdem o medo, a máscara do dia se desfaz pelo cansaço. Tons de cinza invadem as ruas, os rostos, os carros, os quartos. As pupilas dilatam, todo mundo fica mais bonito. Achava poético as luzes amarelas dos postes, em dias nublados o céu alaranjado. Apesar de viado, não gostava de cores nem estereótipos. A palavra gay dá a ideia de que a gente acorda num musical da Broadway. E minha vida não é um musical, tá mais pra filme israelense. Se ser gay é o que dizem por aí, sou assexuado.

A coisa mais incrível era que nada se encaixava, mas parecia fazer sentido. Como as bailarinas do Faustão dançando na apresentação da própria Alanis: bizarro. Buscar explicação pra tudo era coisa de gente paranóica, então se era pra ter um rótulo - gay - , que fosse somente um. Tava tudo meio errado, meio certo, meio torto. Mas com o seu sentido, que só a coisa em si sabia qual era. Tudo questão de ponto de vista, já pensou que no espaço, a Terra está no céu?